domingo, 24 de maio de 2015

A ponte

O atravessamento contínuo do rio Tejo na área urbana da capital, uma aspiração quase secular, foi traduzido em termos técnicos, e pela primeira vez, pelo Eng.º Miguel Pais que propôs em 1876, em desenho, uma ponte entre o Grilo e o Montijo.

World without us, Lisbon bridge, josh, 2007.
Imagem: Space Collective

Esta proposta contemplava uma solução mista para os tráfegos rodoviário e ferroviário, de tabuleiro duplo e com setenta e seis tramos, dos quais setenta e quatro tinham 60 metros de vão e os dois extremos, 48 metros.

Post Apocalyptic bridge on Tagus river..., Peter Baustaedter, 2013.
Imagem: viralscape

Apesar do grande apoio que colheu nos meios técnicos, na opinião pública e em departamentos oficiais, este projecto não teve seguimento, tendo surgido ao longo dos anos outras ideias para a ligação da capital à margem Sul.

Ponte sobre o Tejo, estudo do engenheiro Miguel Pais, 1872.
Imagem:  Arquivo Municipal de Lisboa

Em 1888 o Eng.º Lye, de nacionalidade norte-americana, propõe a construção de uma ponte entre Almada e a zona do Tesouro Velho (atual Chiado) com uma estação ferroviária próxima do Largo das Duas Igrejas.

Posteriormente, em 1889, os engenheiros franceses Bartissol e Seyrig propõem uma ligação mista entre a Rocha do Conde de Óbidos e Almada, através de uma ponte com 2500 metros de comprimento, que seria assente numa série de arcos com vãos diferentes.

Ponte sobre o Tejo, projecto de E. Bartissol e T. Seyrig, O Occidente n.° 380, ilustração L. Freire, 1889.
Imagem: Hemeroteca Digital

Em 1890 surge nova proposta subscrita por uma empresa metalomecânica de Nuremberga que pretendia construir uma ponte entre o Beato e o Montijo, sugerindo uma localização muito próxima à que tinha sido proposta pelo Eng.º Miguel Pais.

Lisboa monumental, ilustração, Alonso (Joaquim Guilherme Santos Silva, 1871 — 1948).
Imagem: Hemeroteca Digital

Já no século XX, em 1913, foi proposto ao Governo, por uma firma portuguesa, fazer a ligação entre a Rocha do Conde de Óbidos e Almada.

Elegante projecto da ponte Lisboa Cacilhas,
propaganda republicana, década de 1910.
Imagem: O Mundo do Livro

Porém, em 1919, a empresa H. Burnay & C.ª, considerava que a travessia do Tejo deveria ser feita através de um túnel e não de uma ponte. Este túnel teria 4500 m de extensão e ligaria a capital a Almada entre Santa Apolónia e Cacilhas.

Vista do estuário do Tejo anterior à construção da ponte, c. 1960.
Imagem: ed. desc.

Dois anos mais tarde é feita nova sugestão para outra ponte mista, pelo Eng.º Alfonso Pena Boeuf, espanhol, a implantar entre a Rocha do Conde de Óbidos e Almada, com um comprimento total de 3 347 metros.

Curiosamente, esta proposta previa apenas um tabuleiro com via férrea dupla e quatro vias para circulação rodoviária. Em 1926, estando ainda de pé esta proposta, a empresa do Arq.º José Cortez - Cortez & Bruhns, apresentou, em esboço, a sugestão duma grande ponte suspensa de três vãos a lançar entre a parte alta da Rua do Patrocínio e as proximidades de Almada.

O Eng.º António Belo, em 1929, solicitou a concessão de uma linha férrea a construir entre o Beato e o Montijo, que incluía a respetiva ponte para a travessia.

Esta proposta mereceu, por parte do Ministro Duarte Pacheco, a atenção devida, tendo-se aberto para o efeito um concurso público em 1934, que não teve resultados concretos, visto que nenhuma das propostas correspondeu ao que o caderno de encargos estipulava sobre o regime de concessão.

Quatro anos mais tarde, retomada por um dos concorrentes - United States Steel Products - esta proposta também não obteve acordo, apesar da simplificação e redução de custo apresentadas.

Em 1942 foi nomeada uma comissão para o estudo das comunicações entre a zona oriental de Lisboa e o Sul do país, como consequência de diligências promovidas pelas Câmaras Municipais do Barreiro, Alcochete, Moita e Seixal para a melhoria das comunicações entre as sedes dos respetivos concelhos e Cacilhas.

Porém, com a decisão da construção da Ponte de Vila Franca de Xira, foram suspensos os trabalhos desta comissão. O Eng.º Pena Boeuf, em 1951, sugeriu uma nova travessia entre Almada e o Alto de Santa Catarina em Lisboa, propondo uma ponte suspensa.

Finalmente, para o estudo e resolução do problema das ligações rodoviária e ferroviária entre Lisboa e a margem Sul do Tejo, foi nomeada, por Portaria dos Ministérios das Obras Públicas e das Comunicações de junho de 1953, uma nova comissão que concluiu pela viabilidade técnica e financeira da travessia através de uma ponte ou de um túnel.

"Julgo meu dever, agora, se isso me é permitido, sem que a minha atitude pretenda ferir posições ou possíveis interesses criados, que na minha qualidade de Português, e nascido em Lisboa, e ainda como técnico, apresente também o meu parecer pessoal, fruto de muitos anos de análisee de estudos vários relacionados com as soluções das obras que mais uma vez se diz que vão empreender-se no estuário do Tejo.

Ponte sobre o Tejo, projecto de Cassiano Branco, 1958.
Imagem: Arquivo Municipal de Lisboa

Não é, por certo, num simples artigo de jornal que poderei desenvolver amplamente problemas tão vastos e de tão grande complexidade técnica, no entanto vou tentar ser breve e claro nas considerações que se seguem.

Perspectiva da ponte sobre o Tejo vista do lado de Lisboa, Cassiano Branco, 1958.
Imagem: Arquivo Municipal de Lisboa

Direi, pois, que ao projectar-se uma ponte que ligue as duas margens do Tejo, Lisboa - Almada, o problema impõe em primeiro lugar a escolha do sítio exacto do témino da directriz do seu tabuleiro Norte.

Perspectiva da ponte sobre o Tejo vista do lado de Almada, Cassiano Branco, 1958.
Imagem: Arquivo Municipal de Lisboa

Este é o principal ponto nevrálgico [...]"

Cassiano Branco in "A ponte sobre o Tejo será a maior do Mundo", Diário de Lisboa 23 de março de 1958

O Governo optou pela construção de uma ponte e pelo Decreto-Lei n.º 42 238, autorizou o Ministério das Obras Públicas a abrir concurso para a sua construção.

Ponte sobre o Tejo, ilustração de Carlos Ribeiro, Revista Eva, dezembro de 1960.
Imagem: Dias que Voam 

Em Dezembro de 1960, foi criado, na dependência do Ministro das Obras Públicas, para a condução deste empreendimento, o Gabinete da Ponte sobre o Tejo, dirigido pelo Eng.º José Estevam Abranches Couceiro do Canto Moniz, na altura director dos Serviços de Conservação da Junta Autónoma de Estradas.

A viga mais comprida do mundo, edição do Ministério das Obras Públicas.
Imagem: Delcampe, Bosspostcard

Em Março de 1960 abriu-se concurso internacional para a execução da obra, tendo esta sido adjudicada à United States Steel Export Company em maio de 1962.

A ponte sem tabuleiro, c. 1965.
Imagem: Estação Chronográphica

Compreendia a construção da ponte sobre o rio, a realização de um complexo rodoviário que incluía 15 km de autoestrada, trinta e duas estruturas de betão armado e pré-esforçado, o Viaduto Norte sobre Alcântara (com 945,11 m de extensão e catorze vãos, cujo tabuleiro de betão pré-esforçado é apoiado em pilares gémeos de betão armado, ligados por uma travessa horizontal a 10 metros do topo, destinada a suportar o tabuleiro ferroviário), um túnel sob a Praça da Portagem (com cerca de 600 metros de comprimento e destinado a receber a plataforma ferroviária do eixo de ligação da rede a Norte com a rede a Sul do rio Tejo), a sinalização e iluminação de toda a obra. (1)

Viagens escolares a Portugal.
Imagem: Herolé Reisen


(1) Estradas de Portugal

N. do E.: algumas imagens apresentadas são meramente ilustrativas ou conceptuais e não representam a vista real do empreendimento.

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