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sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Alfredo Keil e o vapor da carreira de Cacilhas

A boa fada que presidiu ao seu nascimento votara-o á Arte. Nasceu artista. Nas suas phantasias de creança, nos seus devaneios d’adolescente, apparecia-lhe sempre uma figura divina, que o chamava, sorrindo, mostrando-lhe coroas de louros.

Vapor no Tejo (detalhe), Alfredo Keil 1890.
Casario do Ginjal

Foram as artes plasticas que primeiro o attrahiram; a seducção da fórma, o deslumbramento da côr, levaram-n'o para a pintura. Consagrou-lhe com ardor Alfredo Keil os primeiros annos da sua juventude, e entre os moços pintores que, a esse tempo, procuravam uma vereda segura d'arte, elle era dos que seguiam impulsionados por mais orgulhoso enthusiasmo.

Natural de Lisboa, onde seu pae, Christiano Keil, era muito conhecido e estimado, partiu, em 1868, para a Baviera, com desasete annos, a encetar os seus estudos artisticos, e foi na patria d’Alberto Dürer, na velha e pittoresca Nuremberg, que começou a cultivar a arte.

O vapor da carreira de Cacilhas, Alfredo Keil.
Arquivo dos Portos de Lisboa, Setúbal e Sesimbra

A residência n'essa cidade, tão impregnada da attrahente poesia do passado, tão cheia de velhos monumentos, nao podia deixar d'influir no espirito juvenil d'Alfredo Keil e lançar n’elle a semente d’essa poética melancolia que o faz procurar asylo, para as suas horas de trabalho, junto ás penedias do oceano, que parecem desmoronamentos de velhas cathedraes, e em que as ondas vem quebrar-se entoando psalmos d’uma liturgia grandiosa. 

De Nuremberg, Keil passou a Munich, mas a sua delicada saude obrigou-o a deixar a Allemanha, e foi em Lisboa, com Joaquim Prieto, que continuou a estudar pintura.

Barcos no Tejo, Alfredo Keil.
Arquivo dos Portos de Lisboa, Setúbal e Sesimbra

Em 1876 expoz, pela primeira vez, trabalhos seus na Sociedade Promotora de Bellas-Artes. Em 1878 concorreu á Exposição Lniversal de Paris com o seu bello quadro "Melancolia".

Em 1886 á Exposição de Pintura de Madrid com o "Pateo do Prior" e "Boa lamina" que lhe obtiveram o ser condecorado com a ordem de Carlos III. Já em 1885 o governo portuguez o agraciara, pelo seu mérito artistico, com o habito de Christo.

Em 1890 abriu no seu atelier, na Avenida da Liberdade, uma exposição onde apresentava umas trezentas telas, na sua maior parte estudos de marinhas e de paysagem, que quasi todas foram adquiridas por diversos amadores, muitos d’elles estrangeiros.

Cacilhas, Alfredo Keil.
Arquivo dos Portos de Lisboa, Setúbal e Sesimbra

Este artista, que, sem ser impulsionado pela rigorosa exigencia d'attender ás necessidades da vida, se dedicava com tal ardor ao trabalho, era um espirito complexo e inquieto, a quem a pintura não bastava, e, ao mesmo tempo que lançava na tela, n’uma pâte delicada e fina com escrúpulos singulares de nitidez, as suas impressões visuaes de paysagista, ia coordenando a harmonia dos sons, as vozes do mar a que estudava os cambiantes da vaga, a variedade de cantos, que em maravilhosos accordes animam o campo e os bosques, as alvoradas festivaes da natureza, os hymnos religiosos da noite, para os traduzir também pela arte sublime de Palestrina e de Mozart. (1)


(1)  Ribeiro Arthur, Arte e artistas contemporaneos (II), 1898

Artigos relacionados:
Invocação
Palette de Alfredo Cristiano Keil (1850-1907)

Exposições:
Exposição de quadros de Alfredo Keil, O Occidente n.° 415, 1 de julho de 1890
Catalogo da exposição de pintura de quadros..., Lisboa, A Editora, 1910
Catalogo da exposição de pintura e desenhos de Alfredo Keil no salao da Ilustração Portuguesa . Abril 1912, Lisboa, Tip. A Editora Limitada, 1912 [IllustracaoPort n.° 322, 22 de abril de 1912]
Evocação da obra olisiponense do pintor Alfredo Keil [1953]
Exposição evocativa de Alfredo Keil, músico, pintor e poeta. Palácio Galveias de 3 a 18 de Julho de 1957

Leitura relacionada:
Alfredo Keil, Collecções e Museus de Arte em Lisboa, Lisboa, Livraria Ferreira e Oliveira, 1905
Alfredo Keil, Um independente, 1950
Olisipo n.° 63, julho de 1953
Rui Ramos, O Cidadão Keil, Publicações D. Quixote, 2010

Mais informação:
Delcampe
Alexandre Pomar, ALFREDO KEIL 1850-1907, Viagens artísticas, in EXPRESSO/Cartaz de 2/3/2002

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