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quinta-feira, 9 de junho de 2016

As Ondinas de Adriano Sousa Lopes

Na praia tranquilla murmuram sonoras
As ondas do mar.
E, ao dôce das aguas murmúrio palreiro,
Na areia dormita gentil cavalleiro
Á luz do luar.


Costa da Caparica, Adriano de Sousa Lopes (1879 - 1944).
Imagem: MNAC (museu do Chiado)

As bellas ondinas emergem das grutas
De vivo coral,
Accórrem ligeiras, e apontam, sorrindo,
O moço que julgam devéras dormindo
No argênteo areal.


Vem esta, e perpassa do gorro nas plumas
As mãos de setim.
E aquella, com gesto divino, gracioso,
Nos ares levanta do joven formoso
O áureo telim.


Costa da Caparica.
Imagem: AVM

Ess'outra, que lavas, que fogo não vibram
Seus olhos de anil!
Debruça-se e arranca-lhe a rútila espada,
Nos copos brilhantes se apoia azougada,
Travessa e gentil.


A quarta, saltando, retouça, lasciva.
Do moço em redor;
Suspira mansinho, de manso murmúra:
"Podésse eu em vida gosar a ventura
Do teu fino amôr!"


Marguerite Gross Perroux, década de 1920.
Imagem: MNAC

A quinta rebeija-lhe as mãos, enlevada
Num sonho feliz,
E a sexta, com tremula e doce esquivança,
Perfuma-lhe a bòcca, formosa creança!
Com beijos subtis...


As Ondinas, Adriano Sousa Lopes, 1908.
Imagem: MNAC

E o moço, fingindo que dorme tranquillo,
Não quer acordar.
E deixa que o abracem as bellas Ondinas,
E languido gosa caricias divinas

A luz do luar... (1)

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Prova de pensionista do último ano em Paris, esta obra de Sousa Lopes inspira-se num poema com a mesma temática de Heinrich Heine (romântico alemão), traduzido por Gonçalves Crespo.

Auto-retrato, Adriano Sousa Lopes (1879-1944).
Imagem:

A sua criação plástica manifesta uma estética simbolista, via pompier, destacando a narrativa e a imagética fantástica de seres ou espíritos elementares da água num espaço imaginário [...] (2)


(1) Heinrich Heine trad. Gonçalves Crespo in Nocturnos, As Ondinas, Lisboa, Imprensa Nacional, 1882
(2) Maria Aires Silveira, MNAC

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