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sexta-feira, 15 de julho de 2016

Os aviadores suíços

Os aviadores suíços Kaeser e Lüscher sobrevoaram ontem a praia da Costa da Caparica e conseguiram fazer três aterragens.

Costa da Caparica, os aviadores suíços do Jung Schweizerland, Oskar Käser et Kurt Lüscher, 12 de agosto 1929.
Imagem: Arquivo Nacional Torre do Tombo

Eles vão renovar esta tarde as mesmas tentativas, descolando desta vez com a carga máxima.

Costa da Caparica, o avião Jung Schweizerland na praia em 12 de agosto 1929.
Imagem: Delcampe - Bosspostcard

A data de partida para a travessia do Atlântico não está ainda fixada, mas terá lugar provavelmente daqui até ao fim de semana da praia da Costa da Caparica, mais extensa que a de Alverca. (1)

Costa da Caparica, diversos aviões na praia, 1929.
Imagem: Delcampe - Bosspostcard

Preparado para voar, o F.190 n°21 é registado na Suíça. Inteiramente pintado em cor de aluminio, recebe a matrícula CH-245 e é baptizado "Jung Schweizerland".

Segunda-feira 5 de agosto, Käser et Lüscher acompanhados por Tschopp, descolam de Dübendorf para Le Bourget. Após ter efectuado uma afinação do motor e acertado a bússula, a equipagem efectua ensaios de consumo e carga. Com os seus 2400 litros de gasolina, fundamentando os seus cálculos no voo de Bailly et Reginensi, Käser estima a autonomia do avião em 50 horas para uma média horária de 155 km/h. Isto deverá então permitir-lhe a duração do voo de Lisboa a Halifax que ele avalia em 40h. No entanto, para os especialistas, os homens são demasiado optimistas, subestimando fortemente os ventos contrários, que terão que afrontar perto das costas americanas.

Carta do Atlântico norte, Farman 190 CH-245, Lisboa - Halifax, 19 de agosto de 1929.
Imagem: AVM

O avião transporta igualmente equipamento de sobrevivência em caso de amaragem: entre outros uma canoa pneumática, máscaras com reservatórios de oxigénio, bombas de fumo, foguetes, canas de pesca, chocolate, água, um aparelho para destilar água e... champagne. Os aviadores vestirão sobre a indumentária normal fatos de macaco emborrachados. Por outro lado, eles não levam consigo equipamento de TSF.

Dia 8 de agosto às 14h20, o CH-245 levanta de Le Bourget para Lisboa apesar da meteorologia pouco favorável. Tomando sem prevenir um percurso de passeio, Käser visita a sua familia em férias, pousando em  La Baule Escoublac às 17h20. No dia seguinte às 10h00, reparte para pousar às 12h13 em Cazaux, que deixam dia 10 às 9h40 para Lisboa onde aterram às 15h40 por engano no terreno militar da Amadora, antes de aterrarem no terreno internacional de Alverca.

Os aviadores efectuam primeiramente uma revisão completa do aparelho com a ajuda dos mecânicos de Alverca. Este terreno, demasiado curto, não pode no entanto convir à sua descolagem com a carga plena. 

Dia 12 de agosto, Käser efectua por três vezes com sucesso tentativas de descolagem na praia da Costa da Caparica.

Costa da Caparica, o avião Jung Schweizerland na praia em 12 de agosto 1929.
Imagem: Delcampe - Bosspostcard

No entanto, no dia seguinte, o major Ribeiro da Fonseca indica-lhes um terreno mais propício em Juncal do Sul não longe de Alverca, numa vasta zona agrícola constituída por zonas alagadiças drenadas, as lezírias, situada na margem esquerda do Tejo, frente a Vila Franca de Xira (hoje Reserva Natural do Estuário do Tejo).

Após terem definitivamente optado por este terreno, os aviadores não esperam mais do que as condições meteorológicas favoraveis para efectuar a sua tentativa. Dia 18 de agosto, decidem partir no dia seguinte.


Ermida de Nossa Senhora de Alcamé na lezíria ribatejana.
Imagem: Concept Board

Dia 19 de agosto à 1h00 da manhã, enquanto Tschopp passou a noite a guardar o avião, Käser et Lüscher preparam as provisões: 6 termos de café com leite, 15 sanduiches, tabletes de chocolate e duas garrafas de Porto Velho. Às 3h15, deixam o hotel "Avenida Palace".

O seu carro é seguido por outros transportando António de Faria, o director da Radio Lisboa, algumas admiradoras suíças e portuguesas, jornalistas, fotógrafos e amadores da aviação. Chegados a Vila Franca, os automóveis e seus passageiros atravessam o Tejo por barco.


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Diário de Lisboa, 19 de agosto de 1929


Na obscuridade, algumas viaturas perdem-se. Às 6h20, o avião está rodeado de automóveis e de um grupo de campinos, guardas da criação de touros, a cavalo, com os seus coletes vermelhos e as suas lanças.

Entre as personalidades presentes, o major Luis da Cunha e Almeida, director do Parque de Material Aeronáutico, Antonio de Sousa, administrador da Companhia das Lezírias, journalistas, um operador da Paramount, representantes das agências Associated Press e United Press e João Santos Moreira, representante da sociedade Atlantic que fornece a gasolina. Os soldados da base enchem os pneus enquanto Tschopp, ajudado por Käser e Lüscher, empilha no posto de pilotagem 7 bidons de 20 litros de gasolina e 2 bidons de óleo.

Luis da Cunha informa os aviadores da situação meteorológica: bom tempo até aos Açores, depois nevoeiro, principalmente sobre Terra Nova. Notícias que não mudam nada para Käser que prevê tomar a direcção da Nova Escócia após a passagem dos Açores.

Os aviadores vestem então os seus fatos de macaco estanques de cor verde. Em modo de brincadeira, Tschopp oferece a Käser uma rolha de cortiça para os ajudar a flutuar, em caso de… utilizam o mesmos sextantes e corrector de rota que Gago Coutinho e Sacadura Cabral quando do seu voo transatlântico. Ribeiro da Fonseca e o engenheiro Salgado ensinaram a sua utilização a Lüscher.

Às 6h45, o Junkers "Monteiro Torres" pousa a algumas dezenas de metros do Farman. A bordo encontram-se o tenente-coronel Cifka Duarte, o major Ribeiro da Fonseca, o tenente Cardoso e o mecânico Oliveira que vieram desejar boa viagem aos aviadores suíços.

Junkers W34-L Monteiro Torres, documentário A Largada das Águias, 1935.
Imagem: Cinemateca Portuguesa

Às 7h12, o motor é posto em marcha. Às 7h15, está em pleno regime. às 7h17, Käser, satisfeito com o funcionamento do motor, chama Tschopp e abraça-o. Às 7h18, o Farman, segundo o Diario de Lisboa não levava mais do que 2100 litros de gasolina (o que poderia querer dizer que os reservatórios das asas não foram utilizados?) e 80 litros de óleo, o que lhe permitia 42 h de voo, começa a rolar e descola às 7h19 depois de uma corrida de 1200 m.

Oskar Käser e Kurt Lüscher, descolam para Halifax num campo das lezírias, 19 de agosto de 1929.
Imagem: Crezan Aviation

O Farman CH-245 é observado quando sobrevoava os Açores (Terceira) cerca das 18H00, tendo percorrido 1600 km aproximadamente em 10h40 de voo segundo um horário próximo das suas previsões. Mas falta-lhe ainda percorrer para chegar a Halifax os 3000 km mais difíceis com uma meteorologia desfavorável.

Oskar Käser et Kurt Lüscher junto ao Jung Schweizerland antes da descolagem para Halifax, 19 de agosto de 1929.
Imagem: Aargauer Zeitung

As luzes do Roosevelt Field ficariam acesas toda a noite, mas o punhado de apoiantes entre os quais figura o capitão Lewis A. Lancey, navegador do Bellanca "Pathfinder", esperariam em vão: o CH-245 e a sua equipagem desapareceram algures entre os Açores e Halifax; jamais seriam encontrados. (2)


(1) Le Petit Parisien O suiço Kaeser prepara-se em Lisboa para a sua travessia do Atlântico 14 de agosto de 1929
(2) Crezan Aviation

1 comentário:

  1. Excelente artigo. Eu próprio tenho preparado um rascunho sobre este raid, envolvendo Alverca e as OGMA, tendo como fontes alguns jornais franceses, a Torre do Tombo, o Diário de Lisboa e a hemeroteca de Lisboa.
    José Santos
    www.ex-ogma.blogspot.com

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