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terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Grande passeio à Outra Banda (9 de 10)

O Gambôa o olho deita, 
Furioso como um toirão! 
E aqui se põe á espreita, 
Que viesse algum carrão.

A mana, n'um repellão, 
De enfado e Dona Francisca, 
Dão meia volta á direita 
E cada uma se sisca, 
Por aquella escuridão! 

Diz o padre: "Está bonita... 
Que bella illuminação!
Isto ninguém acredita 
E perco eu p'r'um tostão 
O ver a... Linda Chiquita!"

Volta o Gambôa: "Ora bolas! 
A Chiquita está na França, 
Hoje era opera com dança, 
E musica com castanholas. 
Era a Carmen de Bizet; 
Meu q'rido padre José, 
Bem se vê que é de Alcoentre, 
Hoje não tinha voce, 
A bella dança do ventre."

As duas pequenas riam; 
No rapaz dera-lhe o somno, 
Caminhando como um mono, 
Muito atraz de quantos iam.

Passavam mil franchinotes
Cantarolando em tropel, 
Com lanternas de papel, 
Dizendo ao rancho dichotes.

Vários faias e fadistas, 
Bem diziam os grèvistas, 
Por darem occasião, 
A tamanha reinação!

A mana, de olhar tirano, 
Suando-lhe toda a fronte, 
Exclamava: "Mano! oh! mano,
Temos Maria da Fonte!"

O padre temia então, 
Que a guarda municipal, 
Atirasse um esquadrão, 
Pr'o meio da capital! 

E deu um enorme grito, 
Com entono doloroso, 
Quando ouviu uns sons de apito, 
No Paço do Bemformoso! 

D. Francisca já dava, 
No marido alta desanda, 
Por ter ido á Outra Banda, 
toda se arrepellava! 

"Você é que teve a culpa, 
De em tempo de revol'ções, 
Sahir co'a gente a funcçoes,. 
Não tem nenhuma desculpa.

Antes ter ido a Queluz, 
Antes termos ido a Bellas, 
Não andavamos sem luz, 
Nem lá ás apaldadellas!"

(Grita o Gambôa)

Não foi por poupar dinheiro, 
Que eu não sou pelintra, 
O que propuz eu primeiro?... 
Foi que fossemos a Cintra. 

(A mana)

"Pois eu gostei de Cacilhas."
Então acordam as filhas: 
Ter ido. a Cintra?!... Meus Deus! 
Eu cá não ia mamã, 
Com uns vestidos de lã... 
Com estes velhos chapéos... 
Com estes grandes cuxixos... 
P'ra nos tomarem por bixos, 
P'ra rirem da gente toda! 
Com uns monos d'uns vestidos, 
Que além de estar encardidos, 
As mangas não têm á moda! 

(Grita : a mana)

Abanar-se com o leque, 
"Eu a Cintra não iria, 
Com este meu cazbueque... 
O high-life... o que diria?... 
E lá que a terra é tão fria... 
E que tão janota é tudo... 
Com vestido de velludo, 
Eu só lá passearia." 

(Gambôa azoado)

Fallaram as figuronas... 
Fallaram as paspalhonas... 
Já tudo aqui me atazana! 
E fallou também a mana, 
Rainha das tafulonas!... 
Pretenciosa liró... 
Que ainda sonha em derriços. 
Com cinco dentes postiços, 
E um amarello chinó.

Sente-se um grito afflicto! 
E a exclamação: "Eu caio!" 
A velha teve um desmaio, 
Um valente faniquito!

Torna a si.—Grito geral, 
"Tudo ao Principe Real!"

A creada então dizia, 
Olhando para o theatro: 
"Valha-me Santa Maria! 
Ai, meu rico 104."


(1) Diário Illustrado, 16 de agosto de 1896

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