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sexta-feira, 27 de maio de 2022

Bote Leão (o Rei dos Nordestes)

Sobre a origem desta embarcação pouco se sabe, mas Manuel Leitão, no seu livro "Barcos do Tejo", refere uma declaração, de 1965, do mestre António da Costa Cruz, proprietário de um estaleiro de construções e reparações navais, em Alcochete, referindo que (...) o "Leão. teria sido construído na Junqueira, em Lisboa, havia mais de 140 anos (...). No entanto a inscrição do ano 1781 na antepara da ré sugere que a construção é anterior e o mais provável é que tal tenha acontecido. (1)

Bote Leão de Alcochete.
aNOTÍCIA.pt

Pertencia ao Marquês de Soydos (D. António Pereira Coutinho). De acordo com o Mestre António da Costa Cruz, carpinteiro de machado em Alcochete, terá sido construído na Junqueira. Mantinha rivalidade intensa com o "Diana" (pertencente á viúva do Comendador Estêvão de Oliveira), conseguindo, por vezes, vencer a falua em bolina cercada (cf. o jornal A voz de Alcochete em 1950).

Ainda, de acordo com o Mestre António da Cruz, tinha inicialmente a popa em "rabo de peixe", como a das faluas. Foi este mestre que reconstruiu a popa, alargando a parte que fica fora de água, para evitar que se afundasse tanto, quando carregado.

A popa em rabo de peixe, Barcos de sal (Alcochete), Silva Porto, 1882.
Colecção particular em Braga

A cana do leme foi feita com o calcés do primitivo mastro de "riga" (pinho de Riga) que partiu quando se soltou o estai real num dia de nortada no rio.

Na Igreja de Nossa Senhora da Atalaia, a 7 kms de Alcochete, existe um "ex-voto" que se refere a um milagre que aconteceu no "Leão" numa ocasião de aflição.

Comprado pela Empresa Portuguesa de Navegação Fluvial (detentora do vapor "Alcochete", que fazia a carreira de Alcochete) para eliminar a concorrência ao vapor. Serviu para transportar mercadorias e pessoal de descarga do carvão de navios no cais de Lisboa.

Vapor Alcochete.
Desembarque no cais do Alfeite dos sócios da Associação Naval em 1911.
Hemeroteca Digital

Foi novamente vendido e acabou por ficar nas mãos de Manuel Brigue e, depois, de João Baptista Damiães. Após a morte de João Baptista Damiães, o bote conservou-se na praia de Alcochete, porque a viúva e os filhos lhe tinham muito amor e não tinham coragem de se desfazer dele.

Após receberem garantias de que o "Leão" não seria abatido, a família consentiu na transferência da propriedade do bote para a Sociedade que o mandou restaurar para ser oferecido ao Grupo de Amigos do Museu de Marinha.; Sociedade é formada por João Augusto Vieira, José Vieira Júnior, Manuel António de Castro e Luís Lopes Silveira.

Restaurado pelo Mestre António da Cruz antes do seu ingresso no Museu de Marinha. (2)

O bote Leão serviu a população de Alcochete até à década de 60 do século passado, contribuindo decisivamente para o desenvolvimento da vila, pois com as outras embarcações de Alcochete impulsionou uma intensa atividade fluvial, não só no abastecimento de mercadorias à capital, mas também no transporte de pessoas e no carrego e descarrego de navios fundeados no rio Tejo (...)

São três as emblemáticas embarcações que nesta altura faziam a ligação entre Alcochete e Lisboa: a falua Diana e o bote Leão, que em 1907 passaram a pertencer à empresa portuguesa de navegação fluvial, assim como o vapor de Alcochete, que assegurou a carreira entre as duas margens de 1904 a 1958.

O vapor Alcochete que conduziu os convidados ao Alfeite, 1911.
Hemeroteca Digital

Só em outubro de 1917 é que o bote é registado em nome da empresa, por ter iniciado nesse ano a sua função no transporte de carga e passageiros. O bote Leão navegava à vela e a remos e tinha lotação para 26 passageiros.

Em 1925 a embarcação foi transferida para a delegação marítima do Barreiro, e o seu registo ficou afeto ao cais de Alcochete, mantendo-se propriedade da empresa até 1939, ano em que foi vendida pela quantia de quantia de vinte mil escudos a Manuel Brigue, morador em Alcochete.

Em 1941 o barco foi adquirido por João Baptista Damiães, residente em Alcochete pela quantia de vinte e oito mil escudos. Após a sua morte a embarcação ficou durante mais de uma década parada na praia de Alcochete e só em 1967 foi comprada João Augusto Vieira, um dos elementos do Grupo de Amigos do Museu de Marinha, pela quantia de oito mil escudos, que depois a ofereceu ao referido museu.

Transporte do bote Leão de Alcochete para a Doca do Bom Sucesso a 27 de junho de 1967.
Museu [digital] de Marinha

A última reparação do bote Leão foi da responsabilidade do mestre António da Costa Cruz e foi primorosamente pintado por Augusto Rodrigues.

A sua última viagem realizou-se a 27 de junho de 1967 de Alcochete para a Doca do Bom Sucesso, em Lisboa, onde ficou a aguardar a entrada no museu, de cujo património passou a fazer parte.

Mas a entrada tardou e o Leão apodreceu nas águas do rio em que sempre navegou. Contudo durante esse período o Museu de Marinha desenhou planos do bote que permitiram à câmara municipal recuperar a embarcação.

Cana do leme do bote Leão.
Museu de Marinha

Do bote Leão de 1781 apenas resta a cana do leme que está em exposição no Museu de Marinha. (3)


(1) In Alcochete n° 21, junho 2016
(2) Museu [digital] de Marinha
(3) In Alcochete, n° 21, idem

sábado, 7 de maio de 2022

Caldeirada à Fragateiro

O vapor da carreira dá signal, e a primeira escuma escachoa-lhe das rodas, no instante em que rente do caes uma fragata passa, com uma especie de deus marinho á ré, puxando a vela, emquanto o resto da companha desvia com arpões o costado da pesada traquitana, e o cão de bordo agita a cauda aos flavores da caldeirada que no convez refoga alegremente, sobre um lumareu jovial de pinho e d’urze. (1)

Vapor no Tejo (detalhe), Alfredo Keil 1890.
Casario do Ginjal

Os meus avós maternos foram, ele fragateiro e ela cozinheira do melhor restaurante de Caldeirada à Fragateiro, no Ginjal em Cacilhas, o Gonçalves.

Fragata do Tejo em frente ao cais do Ginjal.
Arquivo Municipal de Lisboa

Gostaria de comentar que nesta caldeirada não entrava a batata. Como elementos principais apenas o que era pescado no Tejo, a cebola e o tomate.

O peixe era basicamente o safio, a raia e a tremelga, a que chamavam "galinha do mar", a irós, o xarroco e, às vezes, corvina quando apareciam "enjoadas" à tona da água.

Lisboa vista do Cais do Ginjal, Cacilhas (detalhe), Horácio Novais.

O cozinhado era feito num alguidar de barro que mais tarde passou a ser em tacho, também de barro. Os ingredientes eram colocados em camadas, a cebola, o tomate e o pescado, por esta ordem e tantas quantas fossem, dependendo do número de comensais e não se mexia, apenas se girava (agitava) o recipiente. (2)


(1) Alfredo de Mesquita, Lisboa Illustrada, 1903
(2) Fernando Castro (comentários) em Receitas e Menus .net

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Fragatas e varinos do Tejo
Restaurantes do Ginjal
Caldeirada à Pescador
etc.

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