Estudo para o Panorama de Lisboa, Domingos Sequeira. Em primeiro plano vê-se a ponte sobre a ribeira de Barcarena (dos Ossos) e a igreja da Cartuxa de Laveiras, seguidos da Quinta Real de Caxias. Em segundo plano, uma grande quantidade de navios e barcos sobem o Tejo sobre o cenário da Trafaria e do Cachopo sul ou Alpeidão. Ao fundo, na linha de horizonte, distingue-se o Cabo Espichel. Imagem: Hemeroteca Digital |
Por motivos ainda hoje algo obscuros, Sequeira ingressa na Cartuxa de Laveiras (Caxias) [1798-1801]. O seu recolhimento caracteriza-se por uma assinalável actividade artística, pintando uma série de cinco telas de grande dimensão com passos da vida de S. Bruno (fundador e patrono dos Cartuxos) e de outros santos eremitas (Santo Onofre, S. Paulo e Santo Antão). O conjunto encontra-se disperso por três museus (MNAA, Museu Nacional de Soares dos Reis e Museu de Évora). (2)
Planta da Real Quinta de Caxias, J. A. de Abreu, 1844. Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal |
O insigne pintor Sequeira foi encarregado, não sabemos, ao certo, em que data, nem para que fim , da execução de uma vista panorâmica da cidade de Lisboa. Este facto é comprovado por diversos autores e por alguns documentos inéditos que dizem respeito a este trabalho. A mais antiga referência encontra-se na "Lista de alguns artistas portugueses", por D. Fr. Francisco de S. Luís, Lisboa, 1839.
Vista do Tejo e da Trafaria, The river Tagus at Trafaria, John Cleveley Jnr, 1775. Imagem: Bonhams |
Nela se lê: "Vi em casa de Sequeira, no ano de 1821, o Panorama de Lisboa, em que andava trabalhando".
Posteriormente, em 1843, José Maria da Silva Leal na biografia de Domingos António Sequeira. publicada no jornal de Bellas-Artes, aludia a este trabalho artístico, de que fôra, segundo êle, encarregado em 1821 e l822, nos seguintes termos: "... o panorama de Lisboa, obra já muito adiantada, e cujos desenhos se conservam no archivo das Obras-publicas".
O nosso saudoso amigo Dr. Xavier da Costa, no seu belo livro A morte de Camões, quadro do pintor Domingos António de Sequeira. Lisboa, 1922, transcreveu as duas mencionadas passagens, sem lhes acrescentar quaisquer outros elementos novos.
Vista da Trafaria — Saída da barca Martinho de Mello, João Pedroso, gravura Imagem: Archivo Pittoresco, vol. X, 1867 |
Com a ajuda de diversos documentos que encontramos no Arquivo Hlstórico Militar podemos acrescentar alguna coisa mais sobre este assunto. Logo, pelo primeiro documento que adiante [e no topo da página], reproduzimos, se conclui que, já em 16 de Setembro de 1818, Sequeira se propunha, auxiliado pelo gravador Benjamim Comte, executar a vista panorâmica de Lisboa até à barra e de toda a costa desde Cacilhas até ao Riba-Tejo.
"[...] tomei a deliberação de comvocar o Abridor Bejami Conte. empregado no Real servisso, para me ajudar ad.a empreza, e escolhendo o luçal da Vila de Almada para dali fiqçar os pontos que ofereção a melhor optica: sendo-me precizo para este fim hu.a Barraca de Campanha, de Coronel, por ser mais reparada, e algum soldado tanto para a conduzir ao d.° sitio de Almada, como para a armar nos pontos q.e convier, e guardala, bem como hua incinuação do Governo p.a o Juiz de Fora de Almada me prestar algum socorro sendo-me nescessario para o dito fim" [...]
Domingos António Sequeira (1768-1837), auto-retrato. Imagem: Educación Holística |
Na exposição sequeirense, realizada no Museu Nacional de Arte Antiga, em 1939, figurou um album de desenhos de Sequeira, onde há dois relativos a este panorama de Lisboa. Por especial deferência do seu ilustre director o sr. Dr. João Couto, que, amávelmente, nos forneceu a respectiva fotografia, podemos. enriquecer este artiguelho com a reprodução de um daqueles desenhos.
Não é fácil determinar, com exactidão, o que, realmente, nele figura. Na margem esquerda parece avistar-se a Trafaria e o cabo Espichel.
Na margem direita aparece uma elevação que não conseguimos identificar [n. do e. trata-se da elevação onde está instalado o Forte D. Luís I, ou Forte de Caxias ou Forte-prisão de Caxias].
O querido, amigo Dr. Xavier da Costa, a pág. 27, do seu trabalho Domingos António de Sequeira. Notas biográficas, Lisboa 1939, escreveu: Também D. Frei Francisco de S. Luiz viu em casa de Sequeira, no ano de 1821, o Panorama de Lisboa. em que andava trabalhando.
Alegoria às virtudes do Príncipe Regente D. João (detalhe), Domingos Sequeira, 1810. Imagem: Google Cultural Institute |
Dizem que era obra muito adiantada e que os esboços se conservavam, depois, no Ministério das Obras Públicas. No Museu das Janelas Verdes, existem vários desenhos, preparatórios para o referido trabalho, sabendo-se que um grande Panorama da cidade, da autoria do pintor, desapareceu no violento incêndio que, em 1863 consumiu o edificio dos Paços do Concelho da nossa capital e a parte primacial do seu conteudo.
Alegoria às virtudes do Príncipe Regente D. João (detalhe), Domingos Sequeira, 1810. Imagem: Google Cultural Institute |
Como o arquivo do Ministério das Obras Públicas foi, também, destruído por outro incêndio que devorou a instalação das encornendas postais no Terreiro do Paço, em 1919. Perderam-se lamentavelmente, não só os desenhos de Sequeira para o panorama da cidade de Lisboa, que ali se encontravam, em 1843, segundo informou o jomalista Silva Leal, como o mencionado "grande panorama". (3)
(1) Contar a vida de Sequeira através das cartas
(2) Contar a vida de Sequeira através das cartas
(3) Henrique de Campos Ferreira Lima, Uma vista panorâmica de Lisboa da autoria do pintor Domingos António de Sequeira, Lisboa, revista Municipal, 10, 1941
Leitura adicional:
O desenho em viagem: album, caderno ou diário gráfico, o album de Domingos António Sequeira
O desenho em viagem: album, caderno ou diário gráfico, o album de Domingos António Sequeira (anexos)
A obra gráfica de Domingos António de Sequeira no contexto da produção europeia do seu tempo
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