quarta-feira, 30 de outubro de 2019

A casa da Quinta da Oliveira

D. Francisco de Noronha (1863-1953), fidalgo de quatro costados — e dos quais não blasona — é um ancião de 85 anos, que vive no seu solar modesto de Cacilhas, contiguo aos terrenos que foram dos condes Assumar e dos marqueses de Alorna, integrados na casa Mascarenhas, e que há pouco passaram, e em boa hora, para a Camara Municipal de Almada.

A casa de D. Francisco de Noronha (Prédio do Gato).
Alexandre M. Flores, Almada antiga e moderna, Freguesia de Cacilhas, CMA, 1985

D. Francisco, de memória viva, metido entre os seus livros — que são alguns preciosos — as suas evocações, os seus constantes escritos literários que dispersa, generosamente — conheceu Bulhão Pato. Foi da sua privança.

D. Francisco de Melo e Noronha (1863-1953).
Espólio AIRFA (InfoGestNet)

— Como não ser? Meu tio, que foi juiz desembargador, legou-me esta minha pobre casa, que ele comprara aí por 1872. Por aqui tenho vivido. (1)

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É sempre um prazer encontrar alguém interessado como nós em conhecer os antepassados. Na nossa família existe uma geração em que se sabe ter havido escritura ante-nupcial, em que se estipulava a conservação e prioridade do apelido Netto, num casamento cerca de 1820, em S. Paulo de Almada (meus tetra-avós). também encontrei Assentos de Baptismo, Casamento e Óbito desde cerca de 1580; aliás os assentos só passaram a ser obrigatórios nessas datas. 

Muito do restante foi encontrado em enciclopédias, História de Portugal de Alexandre Herculano, Torre do Tombo e tradição oral e familiar. (2)

Almada, Casa do Gato, posteriormente Externato Liceal de Almada (Externato do Gato), década de 1960.
Casario do Ginjal

É interessante que haja uma certa continuidade da ideia da ascendência judaica, pois o meu trisavô Isidoro d'Oliveira Carvalho Netto (1827-1859), [filho de Isidoro de Oliveira Carvalho nascido em Secarias, Arganil, 1 de abril de 1776 e falecido em Almada no ano de 1849 e de Ana Moreira Netto nascida em Vilela, Paredes, 5 de julho de 1799 e falecida em Almada no ano de 1851, ], tinha uma Estrela de David por cima do portão de entrada da sua casa em Almada [Quinta da Alegria, anteriormente dita dos Bixos?]

[Da descendência de Isidoro de Oliveira Carvalho (1776-1849) e de Ana Moreira Netto (1799-1851), para além de Isidoro d'Oliveira Carvalho Netto (1827-1859), conhecemos ainda Maximiana Isidora Oliveira Netto, nascida na Quinta da Oliveira, Almada, em 23 de abril de 1832, que casou em 2 Fevereiro 1850, em S. Tiago, Almada, com António Carlos Pereira Serzedello, e Feliciana Isidora Oliveira Netto, nascida também na Quinta da Oliveira, Almada, em 24 de outubro de 1833, que casou em 14 Abril 1850 com José Eduardo Pereira Serzedello (v. mais informação sobre os Pereira Serzedello).]

Antiga residência de D. Francisco de Noronha, década de 1970.
Alexandre M. Flores, Almada antiga e moderna, Freguesia de Cacilhas, CMA, 1985

O meu bisavô Isidoro d'Oliveira Carvalho Netto (1850-1883) casou com uma senhora, que também devia ter ascendência judaica e dos 6 filhos que tiveram, 3 tinham nomes judaicos, Moisés Levi, Henrique Samuel e Esther. Um primo que ainda conheci era Levi Jenochio. 

No entanto foram sempre educados na religião católica, com muita abertura de espírito! O filho varão mais velho continuava a tradição do nome e apelido, meu avô José Isidoro d'Oliveira Carvalho Netto (1875-1960) (3)

Á noite deu sr. presidente da camara [Bernardo Francisco da Costa, no domingo, 1 de novembro de 1874, por ocasião dos festejos da inauguração Chafariz de Cacilhas] um baile esplendido ás pessoas das suas relações, tendo-lhe prestado para esse fim a sua casa o seu intimo amigo o sr. Isidoro Netto [Isidoro de Oliveira Carvalho Netto], por ser mais espaçosa do que a de s. ex.ª.

Retrato de Bernardo Francisco da Costa
Galeria dos Goeses Ilustres

Tudo foi deslumbrante n'esta reunião de pesssoas de amisade, primeiro que tudo a amabilidade dos donos da casa, depois a animação do baile, a profusao do serviço; em fim não ha phrases com que se descreva o que ali se passou. 

O baile terminou ás 6 horas da manhã. As toilettes eram em geral de muito gosto. A ex.ª sr.ª D. Luiza Costa tinha um lindo vestido de faie azul claro enfeitado de ramos de flores; — da mesma côr vestia a ex.ª sr.ª  D. Amelia Affonso com toda a elegancia propria da sua ingenuidade; a ex.ª sr.ª D. Amalia Tavares vestia de veludo preto por estar de luto, era rico o seu vestuario; — sua irmã a ex.ª sr.ª   D. Henriqueta Tavares Marques tambem vestia de damasco preto, uma rica toitette; a ex.ª sr.ª   D. Maria José Collares trajava um rico vestido de setim côr de rosa, com enfeitos pretos; — da mesma cõr em damasco, com enfeites brancos, e rendas de França era a toitette da ex.ª sr.ª   D. Izabel Affonso: emfim todas as senhoras estavam elegantissimas. — Foi um baile esplendido na verdadeira significação da palavra. (5)

José Isidoro d'Oliveira Carvalho Netto (1875-1960) nasceu às 20h00 do dia 2 de Junho de 1875, na Rua da Oliveira em Cacilhas, numa casa conhecida por "Casa do Gato".

José Isidoro d'Oliveira Carvalho Netto
(Almada 02-06-1875 – Lisboa 10-01-1960)
Ser Benfiquista

O pequeno José era filho de Isidoro de Oliveira Carvalho Netto, proprietário, natural de Almada e de Dona Júlia Amélia Freitas Netto, doméstica e natural da freguesia de Nossa Srª dos Anjos em Lisboa.

Nasceu no seio de uma família abastada mas quis o destino que na sua meninice a sua família entrasse em falência num processo de garantia para um banqueiro chamado Moura Borges. (4)

Foi educado na Casa Pia, frequentou as Belas Artes de Lisboa, o curso de Escultura com 20 valores, com Anatol Calmels e Jose Simões de Almeida, tio, seus professores. Foi seu colega Simões de Almeida, sobrinho.

As suas obras foram premiadas com Medalhas de Bronze e Prata, em 1895, 1896 e 1898. Em 1910 recebe o Prémio Valmor. Foi bolseiro em Paris de 1909 a 1911. Na Exposição Madrid de 1912 recebeu a comenda de Isabel a Católica. Possui ainda medalha de Ouro da exposição do Rio de Janeiro 1923.

Professor de Desenho da Escola Nacional e vários colégios dependentes da Casa Pia de Lisboa, tendo sido seu aluno Leopoldo de Almeida.

Foi um dos fundadores do Sport Lisboa e Benfica, na farmácia Franco em Belém, em Fevereiro de 1904 [...] (6)


(1) Diário de Lisboa, 28 de agosto de 1946
(2) Manuela Netto Rocha, Geneall
(3) Manuela Netto Rocha, Idem
(4) Ser Benfiquista
(5) Diario Illustrado, 3 de novembro de 1874
(6) José Isidoro d'Oliveira Carvalho Netto, Wikipédia

Artigos relacionados:
Courelas e Figueirinhas
D. Francisco de Noronha recorda Bulhão Pato
Largo Gil Vicente
Serzedello & Ca., Laboratorio Chimico na Margueira

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

Serzedello & Ca., Laboratorio Chimico na Margueira

João António Pereira Serzedello & Companhia, "Droguista e comércio de produtos químicos" instalou-se no início do século XIX na Rua Direita de São Paulo, n.º 53, em Lisboa. Mais tarde, João A. P. Serzedello fundava com os sobrinhos José António, António José e António Joaquim a Serzedello & Companhia sediada no Largo do Corpo Santo, n.º 7. Em 1824, o tio João António deixa a sociedade, ficando este com a firma que já tinha constituído em 1822.

Laboratorio Chimico de Serzedello & Ca., década de 1840.
Documento do acervo de Carlos António Serzedelo Palhares, Lisboa

O Laboratório-fábrica situado na Margueira existiria pelo menos desde 1825, ano em que foi elevado à categoria de fábrica de produtos químicos, com a atribuição do privilégio exclusivo de produção de ácido sulfúrico durante 14 anos.

Foi vendido à família Serzedello, em 1844, e a sua exploração ganhou um considerável desenvolvimento a partir de 1848, altura em que se deverá ter procedido a reformas tecnológicas, tendo-se tornado um estabelecimento de referência no âmbito da química e da farmácia, com participação em exposições universais onde recebeu distinções e nomeações pelos seus produtos.

Serzedello & Ca., década de 1840.
Documento do acervo de Carlos António Serzedelo Palhares, Lisboa

Em 1855 o laboratório da Margueira produzia ácido clorídrico e nítrico, diversos sais de chumbo e mercúrio, dissoluções de sais (de nitrato de cobre e de cloreto de antimónio) e nitratos (de potássio, de bismuto, de prata, entre outros), os “tártaros”, a potassa cáustica (hidróxido de potássio), etc.

Em 1852 a fábrica tinha seis operários. Laborou praticamente até ao século XX. Nela operaram 4 a 5 gerações da família Serzedello. (1)


(1) Ângela Ferraz, Materiais e Técnicas da Pintura a Óleo em Portugal (1836-1914): Estudo das fontes documentais, Volume II

Artigos relacionados:
O laboratório químico da Margueira
Indústria química

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Trio Manuel Mestre: Almada Cidade Jovem

Trio Manuel Mestre.
Discos de Vinil Repetidos

Trio Manuel Mestre.
Discog
A Manel Das Cebolas
B1 Almada, Cidade Jovem 



B2 Portugal É O Mais Lindo

Trio Manuel Mestre.
Discogs

A1 A Franguinha Da Vizinha 
A2 Almada Cidade Jovem 
A3 Vai Ao Minho 
A4 Aldeia Serrana 
A5 Estudantina Portuguesa 
A6 Portugal É O Mais Lindo 

B1 Manel Das Cebolas 
B2 Mineiro Por Natureza 
B3 Truca Laruca 
B4 Regresso 
B5 Viva O Alentejo

Trio Manuel Mestre.
Discos de Vinil Repetidos

A1 Truca Laruca
A2 Mineiro Por Natureza

B1 Estudantina Portuguesa
B2 Regresso

terça-feira, 8 de outubro de 2019

Tourada em Almada

Mais uma vez pedimos providencias para os factos escandalosos que se praticam em Almada, por occasião de tourada.

Almada em Portugal, a multidão descontente tendo maltratado os toureiros, estes largaram sobre ela os touros,
Le Pellerin, n° 1807, 1911.
Delcampe

Ante-hontem começou o escandalo por metterem o gado na praça ás 7 horas da manhã, com grave risco das pessoas que transitam pela povoação, e quando todos julgavam que poderiam caminhar socegados, apparece na Piedade um touro que, por falta de cuidado da parte dos moços da praça tinha d'ali saído. 

Corrida de touros na Cova da Piedade.
Alexandre Flores, Almada antiga e moderna, roteiro iconográfico, Freguesia da Cova da Piedade, 1990

Duraram as correrias até ás 10 horas e meia da manhã, e á hora em que escrevemos, não se sabe ainda o paradeiro de outro touro que não chegou a entrar na praça. 

De tarde, quando começou a corrida, apresentou se na praça o cavalleiro Batalha, montado n'um rocinante que só tinha pelle e osso, e que foi alvo de grossa pancadaria.  Tanto o primeiro como o seundo cavallo foram alugados a um burriqueiro de Cacilhas. 

Touros largados contra a multidão,
Le Petit Journal, 20 de agosto de 1911.
Mundo do Livro

Os bandarilheiros fugiam dos bois, como o diabo foge da cruz, como se costuma dizer. Rara era a vez que o "intelligente", que exercia as funções de clarim, mandava agarrar o boi, que não saltassem á praça duzias e duzias de espectadores para serviem de moços de forcado. Muitas vezes não se via o touro. 

É preciso obstar a estes abusos. (1)


(1) Diário Illustrado, 4 de setembro de 1877

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Praça de touros do campo de S. Paulo