Torre Velha, John Thomas Serres, c. 1801. Imagem: Catarina Pires no Facebook |
1801
Em 1801, terminado o infeliz conflito que ficou conhecido por "guerra das laranjas" e nos custou a perda de Olivença, encontramos de novo desactivadas as fortalezas da margem sul. As guarnições haviam sido reduzidas ao mínimo e descuradas as dotações de pólvora e munições.
A situação de abandono das fortalezas e a negligência em cuidar da defesa manteve-se até à partida de D. João VI para o Brasil. Os acontecimentos europeus pareciam não perturbar a inércia da corte e dos responsáveis. A Torre conservava as linhas gerais de 1692, apenas com a renovação da bateria baixa, aliás inacabada.
Torre Velha, corte pela falésia. Imagem: Pedro Cid, A Torre de S. Sebastião de Caparica... |
Confirma-o uma memória do marquês de La Roziere onde se indicam 4 baterias: a primeira era aquela designada em 1692 por braça baixa e ficava virada a norte; tinha sete peças de ferro calibre 24 e duas peças de bronze calibre 18 "sobre reparos de marinha quase apodrecidos".
A segunda bateria estava na explanada imediatamente a sul, contígua e muito alta, era o espaço com parapeito compreendido entre a velha torre e a cortina nascente; tinha 6 peças de calibre 6 "sobre reparos de marinha fora de serviço".
A terceira bateria estava na explanada dita "praça alta" em 1692; tinha 5 peças de bronze de calibre 18.
A quarta bateria era provavelmente aquela abaixo e contígua à primeira, mas não havia sido acabada; é uma das previstas no projecto de D'Alincourt.
1807 (ocupação francesa)
A situação da Torre de S. Sebastião e dos seus acrescentamentos constam do relatório do oficial francês Amaute elaborado em 6 de Dezembro de 1807, logo após a ocupação francesa: Forte da Torre Velha.
Esta fortificação é fechada por urna porta dupla [refere-se à porta de armas na cortina sul], está rodeada de um pequeno fosso do lado de terra, não foi feita senão para bater o rio; entretanto podia fazer-se aí uma vigorosa defesa, se bem que ela seja dominada por uma elevação não inferior a 150 toesas [1, 82 m...]
1810
A ideia de uma linha de defesa terrestre na margem sul não era nova — tivera-a já o conde de Lippe em 1762 — mas foram afinal os ingleses que, sob as directrizes do tenente-coronel J. Fletcher, comandante do corpo de engenheiros de Wellesley e do capitão John Jones, adjunto daquele, que executaram as linhas de defesa, nos anos de 1810-11.
Esboço do terreno da margem esquerda do Tejo, extendendo-se de Almada à Trafaria, entrincheirado como posição militar, cf. Journals of sieges carried on by the army under the Duke of Wellington, 1811-1814. (Assinalam-se também o Vale de Mourelos interseptado por vedações e os esteiros no lugar da Piedade) Imagem: Internet Archive |
Duas linhas no total de 21 fortes protegiam os ingleses de um ataque por sul, cobrindo a margem do rio desde a Margueira até Alpena. Com excepção do Forte de Almada, o n.° 1 da segunda linha eram todos redutos de campanha, de construção provisória.
Estas linhas, tal como a linha de defesa próxima a nõrte de Lisboa, destinavam-se a exercer uma acção de retardamento no caso de rotura das Linhas de Torres ou de um poderoso ataque pelo Alentejo permitindo nestes casos o reembarque das tropas inglesas.
Quanto aos franceses de Junot, não chegaram a construir qualquer linha de defesa equivalente, mas colocaram na margem esquerda um forte contingente de tropas. (1)
1813
Foi em 1813 que o lazareto foi mudado para a Torre Velha, ou de S. Sebastião, havendo então três barracas para arrecadação de fazendas, um acanhado armazém sobre a bateria do forte e mais duas pequenas casas, uma para recolher os escaleres, tendo superiormente a secretaria, e outra, chamada a da balança, onde eram pesadas as fazendas, a fim de se cobrarem as percentagens, que constituíam, os emolumentos para os empregados.
Era em pontões que os quarentenários, sem commodidade de espécie alguma e em uma accumulação, contra a qual embalde todos reclamavam, tinham de passar o tempo da sua quarentena, sem ao menos haver um isolamento que inspirasse alguma confiança [...]
1837
O conselho de saúde, criado em 1837, representou logo ao governo sobre a impropriedade com que a Torre Velha estava servindo de lazareto, e a necessidade urgente de se construir um em logar conveniente e com todas as condições exigidas pela sciencia moderna e pela humanidade. (2)
1840
Hum occulo apontamos os nós de sobre o terraplano superior da torre de Belem, e com seu auxilio desenhamos nossa estampa, com todas as gentilesas, que d'ali podemos ver.
Vista da Torre Velha, O jovem naturalista n .° 9, 1840.
Imagem: Hemeroteca Digital
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Abstemo-nos de formar a resenha de seus detalhes, por quanto, assaz escrupuloso na imitaçam dos originaes, cremos que nossa estampa falla evidentemente a intelligivel linguagem do desenho, e tanto, quanto em nossa fraquesa cabe. Á vista do que havemos dito da posiçam d'esta torre, he facil de ver, que sua frente olha perpendicularmente ao Septemtriam ou Norte.
Ella parece ser mui anterior á torre, sua visinha.
O gruppo de casas que vemos á direita n'huma pequena praia tem por nome o "Lazareto" onde se depositam as carregações dos navios, que sam emprasados pelo Conselho da saude.
Lá, temos tambem huma rampa, guarnecida d'hum muro, que he o caminho para entrar-se na torre. (3)
Torre Velha, Lisbonne, François d'Orléans, prince de Joinville, 1842. Imagem: Sotheby's |
Em 1844 começou a construcção de dois armazéns de alvenaria em andares, destinados ás mercadorias, e uma muralha na praia para as descargas e desembarques. (4)
1864
A invasão da febre amarella em 1857 foi causa de que se fizessem algumas obras havia muito altamente reclamadas pela hygiene publica, e pelo decoro da capital; e tambem de que se planisassem outras não menos necessarias, mas que não passaram de simples projectos.
Novo lazareto da Torre Velha, Barbosa Lima, 1864. Imagem: Novo lazareto da Torre Velha, Archuivo Pittoresco n.° 27, 1864 |
Entre as primeiras tem um togar distincto pela sua importantia o novo lazareto, obra gigantesca, para a qual não chegou a primeira somma de cem contos de réis votada pelas cortes. Achava-se estabelecido o antigo lazareto na Torre de S. Sebaslilio de Caparica, vulgarmente chamada Torre Velha [...] (5)
1868
Em 11 de maio de ISGS apresentou o engenheiro D. António de Almeida o ante-projecto de uma doca no lazareto, formada por um molhe de alvenaria hydraulica revestido de cantaria, tendo 100 metros de extonsão e parallelo ao cacs de terra, na direcção de Nascente a Poente, deixando ao centro uma entrada de 10 metros de largura.
Vista da enseada da Paulina e da Torre Velha, 1897. Imagem: Branco e Negro Semanário Ilustrado |
Em 1875 construiu-se na doca do Lazareto a primeira ponte-caes de madeira, cujo projecto foi elaborado pelo engenheiro Cândido de Moraes.
Enseada Paulina, cais e armazéns do Lazareto, 1897. Imagem: Branco e Negro Semanário Ilustrado |
Esta ponte deteriorava-se rapidamente, e a doca assoreava-se, o que dava origem a repetidas reclamações do ministério do reino.
Vista da Torre Velha e do Lazareto (novo), 1897. Imagem: Branco e Negro Semanário Ilustrado |
Em 1880 construiu-se nova ponte de madeira, a qual mais tarde foi substituída por outra de estacas metallicas.
Torre Velha de Caparica, 2009. Imagem: Wikipédia |
Em 1892 estava de novo a doca por tal forma assoreada, que o ministério do reino dizia que os passageiros já não podiam ir desembarcar ao caes, o que levou a novos projectos de construcção e de reparação das pontes-caes [...] (6)
(1) R. H. Pereira de Sousa, Pequena história da Torre Velha, Almada, Câmara Municipal, 1997
(2) Adolpho Loureiro, Os portos maritimos de Portugal... Vol. III, Lisboa, Imprensa Nacional, 1904
(3) O jovem naturalista n .° 9, 1840
(4) Adolpho Loureiro, Idem
(5) Novo lazareto da Torre Velha, Archuivo Pittoresco n.° 27 1864
(6) Adolpho Loureiro, Idem, ibidem
Artigos relacionados:
Torre Velha por dom António
Líricas de Melodino
Defesa de Lisboa em 1810 (I)
Defesa de Lisboa em 1810 (II)
Defesa de Lisboa em 1810 (III)
Lazareto de Lisboa, em 1897
Leitura adicional:
Catarina Oliveira, IGESPAR, I.P./ Maio de 2012
Linhas de Fortificação da Margem Sul
Fortificações da foz do Tejo
À descoberta das sentinelas...
Forte de São Sebastião de Caparica (fortalezas.org)
rossio. estudos de lisboa n. 7 dez 2016
A (abandonada)Torre de São Sebastião de Caparica
Lugares Esquecidos, Torre de S. Sebastião da Caparica
Bibliografia:
Sousa, R. H. Pereira de, Fortalezas de Almada e seu termo, Almada, Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Almada, 1981
Sousa, R. H. Pereira de, Pequena história da Torre Velha, Almada, Câmara Municipal de Almada, 1997
Júnior, Duarte Joaquim Vieira, Villa e termo de Almada: apontamentos antigos e modernos para a história do concelho, Typographia Lucas, Lisboa, 1896
Cid, Pedro, A Torre de S. Sebastião de Caparica e a arquitectura militar do tempo de D. João II, Lisboa, Ed. Colibri, 2007
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