quinta-feira, 7 de maio de 2015

O Bugio

Forte ou Torre de S. Lourenço, ou Bugio.

Da fábrica que falece à cidade de Lisboa (i. e. construções que faltam à cidade de Lisboa), Francisco de Holanda, 1571.
Imagem: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de S. Paulo

[...] se possível for havendo pedra ou fundamento seguro podia-se fazer este baluarte no meio da cabeça onde rebenta o mar dos Cachopos, que responde mais fronteiro a S. Gião, o qual podendo ser seria coisa fortíssima e que muito ajudaria a defender a barra de Lisboa de todo o perigo que por ela pode fazer dano alguma hora.

E estes tais baluartes haviam de ser rasos e baixos e fortíssimos e feitos não de pedra e cal mas de tijolo cozido muito delgado e forte que é muito mais seguro.

Digo do embasamento ou do pé do baluarte para cima que deve ser de pedra lioz os quais baluartes ou bastiães podem ser conformes a este desenho ainda que a forma seja pequena por não caber num livro maior. (1)

O projecto [de Francisco de Holanda] acabou por ser esquecido, e só em 1579, com a iminência de um ataque da armada castelhana a Lisboa, essa hipótese voltou a ser considerada, construindo-se então um forte de madeira no areal junto à Trafaria, que não teve relevância alguma na defesa da capital em 1580 [...]

Projecto para plataforma em madeira para o Bugio, Tibúrcio Spanochi, 1594.
Imagem: arquipélagos

Em Dezembro 1589 o monarca [Filipe II (de Espanha)]contratou o italiano Frei Vicêncio Casale para que traçasse a planta do forte da Cabeça Seca.

Descripção da boqua do Tejo, Vincenzo Casale, 1590.
Imagem: Fortificações da foz do Tejo

No final de Janeiro de 1590 o arquitecto apresentava a Filipe II o projecto, que contemplava as obras de engenharia necessárias à implantação da fortaleza no ilhéu de areia fronteiro a São Julião da Barra e apresentava ao rei duas planimetrias distintas, uma estrelada, outra circular. 

Esta última foi a escolhida, por apresentar maior solidez face ao impacto do mar e maior facilidade de mobilização da artilharia. (2)

Torre do Bugio, ed. Postalfoto, 167.
Imagem: Delcampe

Mediante o falecimento de Casale em Lisboa (1593), foram nomeados para dirigir as obras dois discípulos seus, Tibúrcio Spannochi e Anton Coll, sob a justificativa de que ambos eram conhecedores do "modo de fabricar y manejar los instrumentos" e para que a "traça començada" não fosse alterada [...]

A partir de 1598 a direção da obra foi assumida pelo engenheiro militar e arquiteto cremonense Leonardo Torriani, nomeado Engenheiro-mor do Reino, e como encarregado dela, Gaspar Rodrigues (Gaspar Roiz). A partir de então o projeto entrou numa nova fase, dadas as alterações que Torriani lhe introduziu, ampliando-a.

Em 1601 estava finalizada a colocação das pedras das bases [...]

Descrição e plantas da costa dos castelos e fortalezas..., Felippe Tersio, 1617.
Imagem: Arquivo Nacional Torre do Tombo

Em planta datada de 1693 já se encontra figurada uma torre encimada por um farol. O relatório de inspeção efetuada em 1751 ao farol, mostra que o mesmo operava com azeite, no período de outubro a março, e que se encontrava em razoáveis condições.

Alçado e corte do Forte de S Lourenço da Cabeça Seca,
Mateus do Couto, desenho aguarelado, 1693.
Imagem: Fortalezas.org

Esta estrutura, destruída pelo terramoto de 1755, foi reedificada como um dos seis faróis erguidos na costa portuguesa para auxílio à navegação, conforme determinação de um Alvará do Marquês de Pombal datado de 1758.

O castelo do Bugio ficou tão inundado pela água que a guarnição disparou vários tiros em sinal de socorro e foi obrigada a retirar-se para a parte superior da torre.

Segundo o meu melhor cálculo, a água subiu cerca de dezasseis pés em cerca de cinco minutos e baixou no tempo por três vezes, e às duas a maré voltou ao seu curso natural.


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O novo farol entrou em funcionamento em 1775.

Torre do Bugio na Barra de Lisboa, João Pedroso, gravura
Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

Quando da eclosão da Guerra Peninsular (1808-1814), já estava ocupada pelas tropas napoleônicas (1807). O coronel Vincent, comandante da Engenharia das tropas de Jean-Andoche Junot, considerava o Bugio uma fortificação inadequada à defesa marítima de Lisboa, "(…) um fraco obstáculo contra o inimigo que, com vento favorável, tentasse forçar a passagem da barra".

Portuguese Shipping in the Mouth of the Tagus, S. Clegg, 1840.
Imagem: BBC Your Paintings

Essa visão foi confirmada quando, no contexto da Guerra Civil Portuguesa (1828–1834), o Bugio foi alvo do fogo da artilharia da esquadra francesa que, sob o comando do almirante Albin Roussin, forçou a barra do Tejo [...] (3)

Na margem norte ainda se fez fogo sobre os franceses, mas na margem sul, a única reacção activa conhecida é a da Torre de S. Lourenço [Bugio]. (4)

A frota francesa commandada por Roussin força a entrada do Tejo, Pierre-Julien Gilbert, 1837.
Imagem: Fortificações da foz do Tejo


(1) Souza, Maria Luiza Zanatta de, Um novo olhar sobre "Da fábrica que falece à cidade de Lisboa" ( Francisco de Hollanda 1571), São Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, 2011.
(2) Património Cultural
(3) Fortalezas.org

 (4) Pereira de Sousa, R. H., Almada, Toponímia e História, Almada, Biblioteca Municipal, Câmara Municipal de Almada, 2003, 259 págs.

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Da fábrica que falece à cidade de Lisboa
O forçamento da barra do Tejo

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