Rua da Judiaria (Almada), Silva Porto, 1879-1893. Imagem:Nuno Prates, Casa dos Patudos |
O dono da casa, Pedro Marques de Faria, era um velho folgasão, em cujo animo nunca entrou a tristeza, ainda mesmo nos momentos mais graves da vida. Dizidor e peteiro, sempre tinha alguma nova anecdota que contar, alguns versinhos que recitar, algum caso notavel de que ouvira fallar em Lisboa, ou as novidades politicas falsas e verdadeiras de que a epoca era abundante [ler mais...] (1)
Almada, rua da Judiaria, Barata Moura, 1961. Imagem: Câmara Municipal de Almada |
Era magro [o mestre Damião], afilado, guedelhas brancas e olhar vivo. Arrastava uma perna, dava saliência as ancas, curvava o tronco adiante da linha dos pés. Desprovido de abalos e de conforto. aparecia, em muitas noites de chuva, encharcado, triste de figura, a ponto de provocar compaixão aos rapazes. Residia na Rua da Judiaria, num vago casebre, onde reunia, numa balbúrdia de pocilga, os seus parcos tarecos caseiros com a tralha do ofício. (2)
No "Catalogo dos trabalhos de Silva Porto: expostos na Escola de Bellas-Artes de Lisboa, em junho de 1894", aparece a pequena pintura Rua da Judiaria (em Almada) (19x13 cm) como pertença do sr. Bernardo Pinheiro (Pindella), conde de Arnoso, secretário pessoal do Rei D. Carlos.
Trata-se, de uma anotação de formas, cores e luminosidade que Silva Porto eventualmente usaria numa composição maior e mais elaborada. A silhueta humana que o pintor esboça ao centro é voluvel e inacabada. Poderia ser o vendedor de peixe transportando no ombro as canastras enfiadas numa vara, ou, o aguadeiro e o burro transportando os barris com água, sugerido pelos meios-tons da sombra atrás. Os edifícios representados no primeiro plano à esquerda e no segundo à direita ainda existem.
Hoje, esta representação rápida , uma pochade, inclui-se na significativa colecção de obras de Silva Porto, adquiridas por José Relvas. Encontra-se exposta na Casa dos Patudos, Museu de Alpiarça, cujo curador, Nuno Prates, teve a cortesia de nos ceder a imagem em vista deste apontamento.
A Rua da Judiaria, uma das artérias reconstruídas após o terramoto de 1755, localiza-se no núcleo da antiga vila de Almada.
Lisbon from Almada, Drawn by Lt. Col. Batty, Engraved by William Miller, 1830. Assinalam-se a branco, na Rua da Judiaria, as fachadas de alguns edifícios viradas a poente. |
Os materiais existentes e excedentes da recuperação de Lisboa serviram a técnica da "gaiola pombalina" na construção das novas habitações: os materiais derrocados foram usados para enchimento das alvenarias e as paredes foram reconstruídas utilizando a pedra e a cal.
Rua da Judiaria (Almada), Silva Porto, 1879-1893. Imagem:Nuno Prates, Casa dos Patudos |
No século XIX, a Rua da Judiaria era lugar de passagem para a Calçada da Barroca [e Largo Boca de Vento] onde estavam localizadas a sede da Administração do Concelho (até cerca de 1890) e a Repartição de Finanças de Almada. (1)
(1) António Avelino Amaro da Silva, O Caramujo, romance histórico original, Lisboa, Typographia Universal, 1863, 167 págs.
(2) Romeu Correia, Os Tanoeiros, Lisboa, Parceria A. M. Pereira, 1976
(3) A centralidade da Rua da Judiaria na transição para o século XX
Informação relacionada:
Catalogo dos trabalhos de Silva Porto: expostos na Escola de Bellas-Artes de Lisboa...,, Lisboa, Typ. Franco-Portugueza, 1894
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